Por Fabio Campos
Texto
base: “Mas um
samaritano, estando de viagem, chegou onde se encontrava o homem e, quando o
viu, teve piedade dele.” – Lucas 10.33 (NVI)
Já
faz um tempo que uma inquietação tem me levado a seguinte reflexão: “Por que a
medida de misericórdia é tão rasa na casa de muitos cristãos”? Por que há tanta
dificuldade em abrir um particular “comprometedor”, de foro íntimo, com um religioso?
Por que nos sentimos mais a vontade com pessoas que não são “demasiadamente
justas” (Ec 7.16)? Por quê? Por que temos tanto medo de nos expor a pessoas que
são “corretíssimas” em suas práticas?
Por
estes dias, voltando do supermercado com minha amada esposa - fui surpreendido
numa situação que me constrangeu e me encorajou a refletir sobre este tema.
No
caminho avistamos um gatinho que acabara de ser atropelado. Lá estava, no meio da
rua, estirado no chão. Não havia mais nada a ser feito, pois já estava morto. As
pessoas passavam e viravam o rosto com certo “nojo” (confesso, fiz o mesmo!).
Um travesti, entretanto, se compadeceu do gato. Levando um jornal em suas mãos,
cuidadosamente, retirou o bichano do meio da rua. O carinho e cuidado que
aquele rapaz teve com o gato morto foi notório. Cena de filme.
Achei
incrível, aquilo! O ato daquele rapaz - a misericórdia que ele teve de um
animal morto e sujo de sangue – me fez perguntar: Por que não vemos atitudes
parecidas na casa de algumas famílias que professam o cristianismo? O travesti
teve misericórdia de um gato morto que se encontrava no meio da rua; porém,
muitas das vezes, o religioso não tem misericórdia para com os erros de seus
próprios filhos. Triste, mas isto é uma realidade!
Esse
fato me levou até a parábola do bom samaritano contada pelo Senhor Jesus. Por
que será que Jesus escolheu por parâmetro, o “herege” do samaritano, para
ensinar os mestres ortodoxos o que é de fato conhecer a lei? Pois é, o “endemoninhado”
do samaritano foi o exemplo de piedade qual Jesus usou para ensinar os religiosos
acerca da vontade de Deus: “Eu
quero misericórdia!” Jesus usou, para os judeus da época, o
pior tipo de gente como exemplo. Todos os 613 preceitos da lei que os fariseus tentavam
guardar rigorosamente, Jesus, no entanto, resumiu em apenas dois: “Amar a Deus
acima de todas as coisas e o próximo como a si mesmo”!
Um
samaritano foi exposto para ensina-los que a vida piedosa não se baseia no
tanto de conhecimento teológico adquirido, mas na prática desprovida de medo
das possíveis implicações do fato do “não cumprimento a lei”. O samaritano fez
porque ele era assim. É como o sol que não pode mudar sua essência para brilhar
somente sobre os bons. Ele tão somente brilha!
O
samaritano praticou a lei naturalmente, embora não a possuísse de forma clara
como os judeus. Ele mostrou que a exigência escrita na Torá estava gravada em
seu coração (Rm 2.15). Ortodoxia não é provada com “argumentos”, mas com atitudes;
não se trata de refutações, mas do exercício de misericórdia para com o
próximo. É triste saber que há mais graça e misericórdia fora dos ambientes
religiosos do que dentro das igrejas.
Muitos
filhos não voltam para a casa de seus pais como fez o filho pródigo, por causa
do extremo rigor e a aplicação legalista da justiça. Se Deus registrasse todas
as nossas falhas, quem escaparia (Sl 103.3)? Será que um gato não vale mais que
uma pessoa feita à imagem e semelhança de Deus?
C.
S. Lewis, escritor do século passado, disse que “de todos os homens maus, os
homens maus religiosos são os piores”. “Acautelai-vos
dos maus obreiros” (Ef 3.2). A religião matou Jesus em
nome de Deus. Que paradoxo, né!?
Não
foi o sacerdote e nem o levita que cumpriu a lei, mas o “herege” do samaritano.
Ele não tinha a ortodoxia na mente como tinha os peritos da lei. Ela, contudo,
estava fincada em seu coração.
A
teologia perfeita consiste em duas matérias: 1) amar a Deus acima de tudo e 2) amar
o próximo como a si mesmo; o resto, é nota de rodapé! A melhor forma de
demonstrar amor para com Deus se encontra no exercício de misericórdia que
empreendemos para com o próximo, como Ele mesmo disse: “Desejo misericórdia, não
sacrifícios”. Qual era o público alvo de Jesus a
despeito da exortação? Os fariseus, o pessoal mais “santo”. Precisamos entender
que ele não trata com justos, mas pecadores.
A
religião potencializa o homem a cometer atrocidades sem o sentimento da culpa. Este
não é o Espírito de Cristo. Creio que fosse difícil ser igual aos fariseus, com
todas suas práticas. Porém, mais difícil ainda é ser seguidor do Senhor Jesus: “Se a justiça de vocês não for
muito superior à dos fariseus e mestres da lei, de modo nenhum entrarão no
Reino dos céus” (Mt 5.20). Negligenciar a justiça, a
misericórdia e a fidelidade, que são os preceitos mais importantes, é negar
toda a lei (Mt 23.23). O assunto é mais sério do que imaginamos!
“Bem-aventurados
os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia” (Mt 5.7). Se você for
alguém que não precisa de misericórdia, por favor, desconsidere o texto. Mas, se
você está na mesma situação que a minha, pensemos juntos e supliquemos a graça
de Deus para que possamos exercitá-la com aqueles que carecem
dela. Certamente desfrutaremos deste benefício quando formos encontrados em falta.
Considere
este artigo e arrazoe isto em seu coração,
Soli
Deo Gloria!
Fabio Campos
fabio.solafide@gmail.com
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